um grunho vai atrás do hype e depois fode-se


admito, eu também andava a salivar com a perspectiva de ler um livro do Pynchon, e não é por achá-lo encantadoramente idiossincrático, aquilo de não aparecer, de não dar a cara, isso também o fazem as senhoras que se prostituem e que vão falar do assunto à júlia pinheiro, passe a redundância, na verdade convenci-me de que seria mais um americano que valeria a pena conhecer, já que ainda os desbastei pouco, aos americanos, o que é uma vergonha, na verdade já apareci uma vez na capa do Avante e portanto há que gostar dos ianques com parcimónia, imperialistas e o raio, bons são os chineses, comezinhos e progressistas, mas adiante, queria só dizer que não gostei d'O Leilão do Lote 49, talvez porque não é para o meu arcaboiço intelectual que tem a espessura de uma cintura do darfur, talvez porque a saraivada de personagens que vêm à liça fazer pilhéria da protagonista me tenha feito suspirar pelos mestres russos, talvez porque os poucos momentos de irrisão me façam ter saudades do anarco-tom sharpismo, mais escorreito, menos hermético, mais à minha moda, talvez porque nunca ando com analgésicos na mochila que ajudem a dissipar o nó nos miolos, e pior, ontem debulhava as últimas páginas do canhenho enquanto no metro, à minha volta, deambulavam um aleijado com o braço ao peito e olhos rancorosos, uma preta sem uma perna apoiada numa muleta de pau, umas dúzias de zombies de agosto muito mal-encarados, e eu a julgar-me também entalado na asfixiante conspiração Trystero ou lá do que é que o romance fala, e não me venham com semióticas e alegorias e o caralho, eu já só suava e acabei por ver a luz no topo das escadas rolantes do Rato, local onde encontrei um indivíduo que considero intelectualmente, sendo que o mesmo me confidenciou nunca ter acabado um Pynchon, ah leão, que alívio, aqui temos o nosso pequeno segredo de polichinelo.
e encerro com uma apreciação à monumental razia feita pela relógio d'água aos acentos do livro, graves ou agudos, sem esquecer o massacre de cedilhas, aliás, só não falo de genocídio ortográfico porque tenho medo que algum turco agressivo me ande a ler e que julgue estar-se aqui a tratar daquela merda dos arménios, quando a questão é muito, mas muito mais simples, chama-se revisão e assim. vejam lá isso, pá. os autores de culto e seus leitores agradecem. os outros, ligeiramente menos masturbatórios, também.




13 comments:

Anonymous said...

como só leio clássicos (vá, tendencialmente) e me afasto das novidades como diabo da cruz (vá, tendencialmente) tb me arrepelo com a Relógio d'água. publicam tanta e tão boa coisa mas depois adquirem velhas traduções, com décadas, em vez de fazerem póprias (veja-se o Lowry do Vulcão) e enchem os livros de erros. Até na infantil, os Irmãos Grimm tem uns atrás dos outros (os erros).

e é verdade, aquilo da feira dos livros policiais ser uma feira de livros policiais é um bocado exagero. havia lá uma fila de livros, todos da asa (vá, tendencialmente)mas nenhum do simenon

bernardo moura said...

olha, no outro dia comecei a ler esse mesmo livro, que encontrei numa prateleira cá de casa. Andava curioso com o Pynchon. Desisti ao fim de umas 30 páginas porque não estava a seguir bem o fio à meada e o que eu queria era qualquer coisa mais de ler tranquilamente na praia. Mas ainda hei de atacar o "V.", que dizem ser o melhor livro desse senhor.
Abraço

JASG said...

cum catano(!)
será que o "aleijado com braço ao peito e olhos rancorosos" era eu?...

tiago sousa garcia said...

Epá, parece que agora anda tudo a ler o Pynchon. Acabei de o ler na semana passada (em inglês, a contribuir para a confusão paranóica da trama). Devo dizer-te: gostei. Muito.

Abraço,

tsg.

jaa said...

Bom, independentemente da opinião com que se sai do livro, a sua experiência no metro mostra que ele é eficaz.

(Eficaz a quê? A estoirar com os miolos, literal ou metaforicamente. Aliás, estou a tentar ganhar coragem para ler o Gravity's Rainbow mas receio dar um tiro na cabeça antes de o terminar. Se entretanto arranjar uma arma de fogo, claro.)

Lourenço Cordeiro said...

Absolutamente por acaso (só vi a crítica do Casanova no dia seguinte) também acabei de comprar um exemplar para mim. Está lá na minha mesa de cabeceira em lista de espera, como o Estrela Distante do Bolaño que gostava de despachar antes do 2666. Mas por enquanto - e para desenjoar da bomba calórica que foi London Fields - comecei o primeiro volume daquela trilogia policial sueca.

Anonymous said...

Pois, é natural. Já eu, por exemplo, não gosto de batatas fritas. Mas em matéria de grunhos, estou sempre disposto a ler qualquer um.

Anonymous said...

queria era que traduzissem o V ou o gravity rainbow's que eu é mais línguas românicas

Fiel de Armazém said...
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Fiel de Armazém said...

anónimo, o V. está traduzido pela Editorial Notícias e pela Fragmentos. Não são fáceis de arranjar, mas ainda se consegue... Quanto a isso do hype, que eu tenha dado por isso ao lado do Bolaño o hype em torno do Pynchon é irrisório...

Anonymous said...

obrigado, Fiel de Armazém, de facto nunca os consegui encontrar nem ver.

Anonymous said...

olhe, o V comprei-o ei aqui há coisa de 2 ou 3 meses a 1€49 no Jumbo.É da Ed. Notícias.

Anonymous said...

what?!