Crónicas ortográficas de um alfassinha

Que fossa é essa

domingo dia de pausa, missa e feira do livro, ao entardecer os terminais multibanco chilreiam, em competição com os pardais do jardim com falo no topo, com os seus pulmõezitos atabalhoados de fumos e túneis por acabar. pedro vieira, aka o ditador do falecido agridoce, entre outras referências pouco elogiosas, arma-se de três parceiras e galga a calçada à portuguesa até ao promontório provisório onde irá ser lançado o livro que conta a vidinha do Godinho, senhor de timbre mítico em cantado-falado, expondo misérias e paixões e lutas que foram embevecendo a malta ao longo dos anos. Às nove, hora da desdita anunciada, ainda o palco do auditório era tomado por sons africanos, era a iniciativa de música angolana com um trovador um pouco manco de afinações, isto é piada sem graça em terra de minas e armadilhas mas ao dito faltava-lhe a perna do dó a apoiar o ré e nós ala que se faz tarde, aí vão os quatro cirandar feira abaixo-feira acima, para fazer tempo e gastar trocos e sentir cheiro de farturas, cujo imaginário se me toldou ao longo dos anos quando o povo criou a analogia de uma grande moca de drogas, sinónimo de chuto com a seringa das ditas (farturas), o Ruca explicá-lo-ia melhor.
Perto das dez o regresso ao auditório, o "Sérgio" (como é bom ser familiar da tropa fandanga que vai à tv e coliseus) no exterior com ar de enfado, o Galopim escriba escolhido e apresentador anunciado a lamentar "pois, estamos em Lisboa", noutras terras não há atrasos, se calhar abaixo do Equador haverá alguns mas também lá há outros fusos e isso é outro paleio que não cabe aqui. No placo desenvolve-se surrealismo em ritmos afro, agora com novos-melhores protagonistas, o vocalista/baterista de serviço brada "mais palmas que eu não ouvo" ou "eu avisei, eu é fogo", o ritmo em crescendo, o senhor da APEL em fatuncho e gravata dos 300 a bufar de raiva e preocupação, os pretos a gingarem o povo da semi-bancada, o ritmo acelerado a roçar a apoplexia faz com que um maduro suba ao palco e solte a franga, isto é uma figura de estilo, a franga teve-a guardada mas ameaçou sodomizar uma coluna de som com ela escondida, fez belly dance de camisa arregaçada, bamboleou o traseiro como se disso dependesse a sobrevivência da espécie dos dançarinos espontâneos e o número acaba em arrebatamento da assistência. Entre aplausos e gargalhadas eu já berrava "só mais uma", dois ou três corroboravam, e o senhor da APEL com a fúria a rebentar-lhe o fatuncho pelas costuras e a esbracejar como quem diz "acabou", o povoléu a sair em catadupa, o Galopim e o "Sérgio" que já vão entrando, sem deixar que os patrícios arrumem devidamente a tralha, o consagrado pelos vistos já se esqueceu de quando não tinha roadies que lhe empacotassem a tralha num piscar de olhos. Sentados na mesa da honra com h pequeno, com ar blasé e vinho tinto a condizer lá vão iniciando a tal apresentação do tal lançamento, o "Sérgio" vai fazendo caretas e acenos aos pretos que nunca mais abandonam a sala, a arrastar tarolas e batuques pela alcatifa sintética, acho que nunca houve de outro tipo portanto chamemos-lhe apenas alcatifa. Os ruídos de arrumação atropelavam a prelecção do Galopim iniciada à pressão, ninguém se lembrou que os que agora saem também foram obrigados a actuar com atraso, dois retardatários passam à frente da mesa para levar a última conga e o "Sérgio", que já sentiu uma força nos dentes mas que agora é snob de pivôs e postiços chama a atenção à populaça e, escarninho, lança: "vejam, não percam este grande momento", os admiradores riem, a nós os quatro salta-nos a mola, saimos imediatamente perante o triste espectáculo do narciso que já tem a paz, o pão, a habitação, a saúde mas a quem vai faltando a educação.
Inoculado pelo conceito de dar um chuto com a seringa das farturas corremos antes para outro Cavalo, o de Ferro, e lá gasto mais umas economias sem pensar em biografados.

1 comment:

Anonymous said...

pois é, foi mesmo assim!
olha para compensar hoje comprei mais umas carteirinhas de cromos, acho que amanhã já há mais para a troca...

oldboss