como diria o Eduardo Pitta, um livro em cada domingo arrebita, arrebita, arrebita. Quer-se dizer, se calhar o Eduardo não o diria



sinto a veia patriota a latejar ou será só ordinarice ou será por ter gostado molhos do livro do Rui Cardoso Martins (RCM), aquele escriba do levante-se o réu, do Contra, do Pró, do que ele quiser, afinal de contas é profissional da escrita, como se dizia dos guarda-livros, mas sem o culto da tecnocracia, com a criatividade à solta, isso sim, a bem do leitor, de Lisboa, dos ceguinhos e também dos aleijados, dos sós e dos acompanhados, das crianças e de todos aqueles que tiverem o bom senso de pôr as mãos no Deixem passar o homem invisível, cortesia das edições Dom Quixote, e diga-se que este é um canhenho de alguém que notoriamente gosta de Lisboa, alguém a quem a cidade dá um quentinho no coração, e isto para mim já é meio caminho andado, o resto vem com o trabalhar da escrita - repare-se como evitei o verbo burilar, que anda mais gasto do que os lençóis da carolina salgado -, com o denodo empregue no esgalhar dos personagens, anti-heróis, imperfeitos, com mazelas, defeitos, embirrações, gente como a gente, mais o efeito de gancho alimentado pelas águas passadas do cego, "aquilo" que aconteceu "naquele" dia, mais os fios que o entrelaçam ao destino do miúdo, uma espécie de Iñarritu em contexto de esgoto, e que dizer das pérolas largadas ao longo da narração, a stripper que queria a luz de palco baixa, muito baixa de forma a que não se vissem as mamas levantadas com fita-cola, as bicadas nas alegorias com cegos (Saramago, does it ring a bell?) ao mesmo tempo que se faz... uma alegoria com cegos, com direito a descrições de martírios de santos (Saramago, does it ring a bell?) e a passagens acerca do convento de mafra (Saramago, does it ring a bell?), enfim, um baralha e volta a dar à moda do RCM, com fôlego, com a História da cidade generosamente entremeada com o enredo, com o meu bairro a saltitar para a ribalta, os seus poisos de velharias, flores e petiscos e bricabraques, e uma grosa ou duas de linhas dedicadas a fátima e à Lúcia, como é que eu não havia de ficar rendido a este livro, uma espécie de tomo da série Uma Aventura hors série, e isto é um elogio vindo da minha cognição infantilóide, cada um é para o que nasceu, dizia, tudo tão bem confeccionado que até perdoo ao autor ter trocado as linhas de metro, pondo a verde a passar por São Sebastião. Até lhe perdoo, foda-se.

3 comments:

Joana said...

Hum... sim, sim, sim, mas o que queremos saber é quando sai nas bancas e livrarias um manuscrito teu. Falar dos outros é fácil... ;)

aviador said...

Fraquito, o livro.

A linha de Metro ainda é o menos...

aviador said...

Só um pequeno esclarecimento:

Realismo fantástico não é para qualquer um.
Por muito esforçado que seja!